Levi Bronzeado
A tragédia que se abateu sobre Haiti deveria servir para uma acurada reflexão, haja vista a similaridade existente entre a história desse país e a nossa. Fomos um dos últimos países do mundo a abolir a escravidão negra.
Os colonizadores portugueses eram mensageiros de um “deus ocidental” que fazia vistas grossas para o comercio de escravos ─ mão de obra barata para o desenvolvimento da colônia. O “deus de Portugal” e dos nossos colonizadores não levava em conta a libidinagem e atrocidades sexuais que eram realizadas contra as inocentes índias, que a troco de panos, espelhinhos e outros mimos eram violentadas, sem dó nem piedade.
Os historiadores narram que o Brasil Colônia era a terra dos pecados, e associavam a liberdade sexual à ausência quase completa de religião entre os nativos.
O machismo e o racismo com algum verniz de religiosidade cristã foram plantados em nossa terra desde o início de nossa colonização. À medida que as almas eram aprisionadas nos currais desse deus ocidental, os corpos das negras e índias eram devassados, e suas intimidades estraçalhadas pelos ferozes homens apóstolos desse violento deus.
O inferno e o terror do apocalipse eram as armas secretas e ameaçadoras, que os donos do poder colonial lançavam contra aqueles que não se submetiam aos seus desígnios.
O drama do povo Haitiano, explorado de forma ignominiosa por quem deveria zelar pelo seu bem estar, nos faz reportar a nossa História. A história do Haiti parece com a nossa, de duzentos anos atrás. Talvez, seja por isso que a tragédia que se abateu sobre os nossos irmãos negros desse sofrido país nos toca profundamente; talvez seja por em nossas veias ainda correr o sangue desse povo, que foi arrancado violentamente de seus lares africanos para servirem de animais de carga por três séculos em nossas terras.
Mas há quem veja nisso a mão divina. Há quem veja na tragédia recente o castigo divino, sem misericórdia, sobre um povo que por fazer parte de outra cultura religiosa, que não a do “deus ocidental”, deve então estrebuchar e morrer em meio a rios de sangue. Aí os impostores cristãos deitam e rolam citando inúmeros trechos bíblicos para justificar a sua sanha vingativa e racista. Bradam de peito estufado: "Está escrito... Está escrito lá no livro de Fulano, de Beltrano..." ─ é a Bíblia usada para fins pérfidos, maléficos e diabólicos. Os impostores de uma figa dizem: “eles estão colhendo o devido pagamento, por serem os que receberam a marca de Caim na testa, devendo por isso sofrer indefinidamente enquanto vagarem pela terra”.
Infelizmente, o espírito pedante dos nossos colonizadores está presente em alguns “cristãos” da blogosfera. Eles estão radiantes ao tripudiar sobre os nossos irmãos negros haitianos. A dor dos negros é a vitória do seu hediondo deus. E ainda dizem descaradamente: “Te prepara Brasil ─ o próximo castigo virá sobre ti!!!”
Esses falsos arautos de um deus vingativo não vêem que temos uma dívida impagável e imperdoável, tal qual uma mancha inapagável, permanece em nossas consciências, naquilo que foi o insano “tráfico negreiro”.
Amigos, ao invés de desfrutarem o bárbaro deleite de fazer juízo apocalíptico sobre uma nação vilipendiada pelos poderosos, se ajoelhem, ponham a cara no chão e peçam perdão pelos pecados do racismo, da ambição, e do cinismo que por ora dominam as suas mentes! Fujam da cegueira que não permite os olhos enxergarem em cada Haitiano, um Cristo que sofre e pede socorro!
Nunca é demais lembrar que quem semeia a intolerância a colhe em dobro.
Publicado em Ensaios & Prosas
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